TV | Deem um tempo aos Bórgias


Mais uma vez a lascividade e a corrupção atribuída aos Bórgias foi central para contar ao grande público a imoralidade de uma das famílias mais poderosas da Itália.

A série de TV, The Borgias, foi exibida pelo canal Showtime entre ao anos de 2011 e 2013. O drama histórico criado por Neil Jordan tinha o ator Jeremy Irons interpretando Rodrigo Borgia, papa do século 15 que entrou para a história como um patriarca lascivo. Do mesmo canal, era a série The Tudors que transformou a reforma religiosa inglesa no mesmo que The Borgias fez com o renascimento italiano: um período marcado por mudanças políticas permeado com a perversão do sexo e a violência de histórias em quadrinhos. Enquanto um drama, certamente não há censura e se comporta com uma nova moralidade na história popular. The Borgias, The Tudors e Roma, série do canal HBO, nos levavam a concluir que a vida, a reputação e a crença de personalidades históricas são invadidas pelo seu mau comportamento. Porém essa mistura de fofoca e honradez não se aplicava para as sociedades anteriores, que viviam confortavelmente nesse paradoxo da virtude pública e da vida privada.


Se formos acreditar nos rumores sobre Rodrigo Borgia, já teríamos material suficiente para uma boa novela sobre a hipocrisia religiosa. Ele ganhou a eleição do papado subornando cardeais, um dos quais recebeu quatro mulas carregadas de prata. Coroado como Alexandre VI, em 1492, Rodrigo gostava de caças, danças, orgias e bacanais enquanto estava hospedado no Vaticano. Essa sacerdote gerou vários filhos com sua amante que foram usados para buscar pela Europa casamentos que pudessem melhorar a riqueza e o poder da família Bórgia. Sua filha Lucrezia foi prometida duas vezes enquanto ainda tinha apenas 10 anos de idade. Ele fez do seu filho, Cesare, bispo aos 15 anos. Quando Rodrigo morreu, seu cadáver estava tão inchado da extravagância e doença que tiveram que montar sobre o caixão para poder fechá-lo. 

Porém a corrupção moral de Rodrigo Borgia estava longe de ser incomum para um papa medieval. Pio II (1405-1464) é geralmente citado como um exemplo do melhor catolicismo cívico: um laureado poeta imperial, condenou a escravidão e foi um papa que escreveu sua autobiografia enquanto reinava. No entanto é de sua autoria vários poemas eróticos e uma horda de filhos ilegítimos. Rodrigo Borgia nem era assim um pontífice extremamente brutal. Julius II (1443-1513) foi apelidado de “papa temível” e “O Papa Guerreiro” por uma boa razão. 

Mais importante para os seus contemporâneos, a politicagem de Rodrigo era não minar sua autoridade papal. Roma era um pequeno, mas significativo, centro de poder no século 15; seus cardeais faziam altas apostas temporais, com a riqueza e a influência de reis vencedores. Se Rodrigo tivesse sido um santo, ele não teria durado muito tempo. Não devemos confundir o Vaticano “moral-mas-impotente” de hoje como um estado cruzado medieval. 

Nem a promiscuidade sexual de Rodrigo fez dele menos católico ao olhar de seus pares. Claro, eles ficaram escandalizados com sua imoralidade. Porém a maioria via-o mais como um mau católico do que um não-católico. Apenas uma pequena parcela pensou nos comportamentos expostos de Rodrigo como uma fraude cínica.

Papa Alexandre VI (Rodrigo Borgia)

No entanto, esta é a ética moderna que a história popular tenta impor ao passado. Nós parecemos obcecados em desvendar a vida privada destes homens idealistas e religiosos expondo-os como seres frágeis, incapazes de viver de acordo com padrões impossíveis. Nós definimos a integridade pela fusão daquilo que fazemos e dizemos. Se alguém mantem sua vida privada de acordo com sua imagem pública, chora hipocrisia. As livrarias estão cheias de biografias que invadem a vida privada de papas, czares e comissários. Isso é pouco apropriado dada a sua importância relativa e a moralidade mais complexa de uma era pré-democrática. 

Essa tendência é preocupante de procurar personalizar a história ao ponto de transformá-la numa anedota sórdida. Ela margeia o fato de que grandes homens e mulheres foram julgados por gerações de estudiosos, porque eles avançaram ou refletiram um tema histórico. Assim, o Henrique VIII de The Tudors não é irreal, mas ele não é importante porque o show não consegue explicar a longo prazo o estabelecimento da Igreja da Inglaterra. Da mesma forma a arte incerta de governar do mau católico Rodrigo Borgia, não suas mãos errantes.

Este texto foi traduzido e adaptado do original Give the Borgias a Break de Tim Stanley do site History Today. 

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