Nero mandou queimar Roma, só que não.


BASEADO EM FATOS FICTÍCIOS*: Nero não mandou incendiar Roma, mas porque foi acusado como culpado pela tragédia que acometou a cidade em 64 d.C.?

Provavelmente você já deve ter ouvido que o imperador Nero foi o responsável pelo grande incêndio de Roma em 64 d.C. Enquanto a cidade se consumia em fogo, o imperador contemplava toda aquela paisagem enquanto tocava lira. No entanto, a história não é bem essa e o papel do imperador nesse evento foi muito diferente. 


Em 64 d.C., provavelmente entre 18 e 19 de julho, a cidade de Roma sofreu uma das suas maiores calamidades, um grande incêndio que consumiu 10 das 14 zonas da antiga cidade. Uma grande nuvem de fumaça cobriu toda Roma e pessoas que viram suas casas sendo arrasadas e muita morte preferiram, no auge do desespero, atirar-se as chamas do que fugir. 

Mas o que teria causado tão grande incêndio? Teria sido um incidente ou um ato calculado friamente por um intelecto demoníaco? 

Quando se estuda história é importante saber qual discurso estamos lendo ou qual versão do fato estamos lendo. Digo versão porque podemos encontrar diferentes narrações para um mesmo fato, e por vezes narrações comprometidas com algum tipo de calúnia ou difamação. 

Nero não incendiou Roma. Os historiadores não encontraram nenhuma evidência que ligue o imperador Nero como causador da tragédia. Seu papel durante essa catástrofe teria sido bem diferente como veremos mais à frente, mas por ora fica a pergunta: como teria começado o incêndio? 

Há também versões de causas naturais para o início do incêndio. Uma delas diz que como os moradores da cidade habitavam em casas de madeira e geralmente usavam o fogo para se aquecer ou preparar os alimentos, algum acidente provocou o incêndio que se alastrou pela cidade já que ventos fortes ajudaram a propagar as chamas. 

Em outra versão defendida pela maioria dos historiadores, o grande incêndio de 64 d.C. teria começado perto do Circo Máximo, um hipódromo de Roma. Ao redor dessa construção poderíamos encontrar diversos cubículos de madeira usados por astrólogos, prostitutas e cozinheiros que usavam para cozinhar e iluminar o ambiente. Na noite de 18 ou 19 de julho, o calor intenso e as chamas de um desses cubículos teriam se alastrado e devido ao clima e a grande quantidade de madeira o fogo teria se alastrado de forma muito rápida contando também com forte vento que soprava naquela noite em Roma. E por onde andava o imperador Nero nessa história? 



Enquanto Roma era consumida pelo fogo, Nero nem na cidade se encontrava, mas quando soube do ocorrido e, segundo algumas versões, participou dos esforços de combate ao fogo. Mas então por que foi dito que ele seria responsável pela catástrofe? Segundo uma teoria, Nero desenvolvia um grande projeto modernizador de reforma urbana para Roma, dessa forma teria que demolir bairros inteiros para fazer novas construções e para acelerar o projeto, ele teria então mandado incendiar a cidade. 

Após o incêndio, provavelmente muitos boatos alegando culpa a Nero devem ter surgido e tomados por pessoas que eram hostis ao imperador, pois nenhuma evidencia histórica foi encontrada que ligasse Nero como causador do incêndio. 



O filme Quo Vadis ajudou a perpetuar a versão incendiária do imperador Nero. Nesta produção de 1951 dirigida por Mervyn LeRoy, o general Marcus Vinicius retorna a Roma e apaixona-se por Lygia, no entanto ela era uma cristã e não queria nenhum envolvimento com um guerreiro. No entanto Lygia era filha adotiva de um general aposentado. Marcus procura o imperador Nero para intervir e que Lygia lhe seja dada por seus serviços prestados. Enquanto isso, Nero encontrava-se ocupado e seus atos tornavam-se mais perigosos. É importante ressaltar que nesse ponto, o filme Quo Vadis expõem na tela outra versão do grande incêndio em Roma. Segundo essa teoria, Nero ordenou o incêndio em Roma e para desviar suspeitas que cairiam sobre si resolveu culpar os cristãos. Essa versão ainda não foi bem elucidada pelos historiadores, mas acredita-se que tenha sido acentuada por obras de Tácito e Suetônio que eram hostis ao imperador. 

De qualquer forma, o imperador Nero não foi responsável pelo grande incêndio de Roma em 64 d.C. Quando se estuda fatos históricos como o que foi exposto é muito importante ter um olhar crítico para o discurso que se está lendo. Sendo calúnias ou difamações, as teorias que apontam Nero como o incendiário de Roma nos ajudam a entender o contexto de disputas políticas e de poder no império romano.

*"Baseados em fatos fictícios" é a uma coluna do blog História em Cartaz que pretende abordar fatos históricos tidos como verdadeiros, mas que são bem diferentes segundo as descobertas históricas. 

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